Durante sua palestra intitulada O cuidado nas práticas de saúde, ele contou casos vividos durante seus muitos anos de experiência como médico da atenção primária e ressaltou que a ideia de cuidado não é algo versus a técnica, mas é algo com a técnica, e que não se restringe a técnica. Segundo Ricardo, o cuidado, portanto, deve ser pensado como a relação entre dois aspectos, dois polos indissociáveis: êxito técnico e sucesso prático. "O eixo técnico abrange a dimensão do nosso conhecimento científico e técnico, que permite construir hipóteses, propostas de intervenção, e agir na transformação do objeto. Já a ideia de sucesso prático vem na medida em que temos o conhecimento de que essas coisas não estão desvinculadas de um modo de ser, das experiências subjetivas dos profissionais. E o que une esses dois aspectos é o que temos chamado de Projeto de Felicidade de cada indivíduo. Essa noção de Projeto de Felicidade criada por Ricardo abrange ciências biomédicas, saberes tradicionais e sabedoria prática articulados a valores éticos e morais e a condições materiais concretas, definindo assim o que faz a pessoa feliz. "Nesse contexto, a felicidade não é sinônimo de alegria. Ela significa se sentir realizado ou sentir que se está na direção correta para alcançar a realização desejada. Pois em nosso constante desacomodar, procuramos a nossa felicidade. A definição da OMS sobre completo estado de bem-estar físico, mental e social só pode ser alcançada pelos mortos, já que o tempo todo estamos nos movendo e nunca nos sentimos completos", detalhou Ricardo, completando que o Projeto de Felicidade pode ser visto como um horizonte normativo que orienta a caminhada da vida. Sobre as práticas de escuta e acolhimento, ele destaca que é preciso ouvir mais. Porém, além disso, é preciso ouvir com qualidade, incentivar a narrativa do paciente, saindo do roteiro da anamnese padrão. "Permitindo a narrativa, conseguimos alcançar o sucesso prático e enxergar o projeto de felicidade da pessoa, pois é ali que aparecerá o contexto, o tipo de situação vivida e como o paciente valoriza aquilo que ele traz como questão de saúde. Quando interrompemos essa contação de história, perdemos isso. Conheço a realidade da atenção à saúde, as situações adversas enfrentadas no cotidiano e sei que muitas vezes isso impede uma escuta qualificada, mas é possível estimular narrativas, pois assim traremos dados importantes para o cuidado", considerou Ricardo, comentando dados de uma pesquisa feita nos Estados Unidos, que revela que um paciente não consegue falar mais que 16 segundos sem ser interrompido pelo médico. "Isso é um problema grave, um quadro que precisamos reverter", disse ele. Como pontos a serem perseguidos, o médico apontou mais continência e continuidade nos serviços, mais participação dos usuários, mais compromisso dos profissionais, mais resolutividade e mais envolvimento do usuário e das famílias nas ações de cuidado. "O atendimento minimalista mina o cuidado. É preciso responsabilidade e compromisso por parte dos profissionais. Além disso, é válido ressaltar que o trabalho em saúde são encontros entre sujeitos. Portanto, o outro é fundamental para mim". Finalizando sua palestra, Ricardo apontou também a importância de uma abordagem intersetorial ativa. "É preciso tentar implementar isso em todos os espaços que temos. Não devemos esperar as esferas de governo se articularem se eu mesmo posso fazer essa intersetorialidade em nível local, indicando escolas, atividades e outras iniciativas aos meus pacientes. É claro que é importante que esas iniciativas se tornem políticas institucionais, mas eu posso fazê-las antes disso, completou ele.
| Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e automedicação. Fazem parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, quanto do desenvolvimento social e econômico global da comunidade. (Declaração de Alma-Ata) |
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segunda-feira, 19 de março de 2012
INFORMATIVO REDE APS
Durante sua palestra intitulada O cuidado nas práticas de saúde, ele contou casos vividos durante seus muitos anos de experiência como médico da atenção primária e ressaltou que a ideia de cuidado não é algo versus a técnica, mas é algo com a técnica, e que não se restringe a técnica. Segundo Ricardo, o cuidado, portanto, deve ser pensado como a relação entre dois aspectos, dois polos indissociáveis: êxito técnico e sucesso prático. "O eixo técnico abrange a dimensão do nosso conhecimento científico e técnico, que permite construir hipóteses, propostas de intervenção, e agir na transformação do objeto. Já a ideia de sucesso prático vem na medida em que temos o conhecimento de que essas coisas não estão desvinculadas de um modo de ser, das experiências subjetivas dos profissionais. E o que une esses dois aspectos é o que temos chamado de Projeto de Felicidade de cada indivíduo. Essa noção de Projeto de Felicidade criada por Ricardo abrange ciências biomédicas, saberes tradicionais e sabedoria prática articulados a valores éticos e morais e a condições materiais concretas, definindo assim o que faz a pessoa feliz. "Nesse contexto, a felicidade não é sinônimo de alegria. Ela significa se sentir realizado ou sentir que se está na direção correta para alcançar a realização desejada. Pois em nosso constante desacomodar, procuramos a nossa felicidade. A definição da OMS sobre completo estado de bem-estar físico, mental e social só pode ser alcançada pelos mortos, já que o tempo todo estamos nos movendo e nunca nos sentimos completos", detalhou Ricardo, completando que o Projeto de Felicidade pode ser visto como um horizonte normativo que orienta a caminhada da vida. Sobre as práticas de escuta e acolhimento, ele destaca que é preciso ouvir mais. Porém, além disso, é preciso ouvir com qualidade, incentivar a narrativa do paciente, saindo do roteiro da anamnese padrão. "Permitindo a narrativa, conseguimos alcançar o sucesso prático e enxergar o projeto de felicidade da pessoa, pois é ali que aparecerá o contexto, o tipo de situação vivida e como o paciente valoriza aquilo que ele traz como questão de saúde. Quando interrompemos essa contação de história, perdemos isso. Conheço a realidade da atenção à saúde, as situações adversas enfrentadas no cotidiano e sei que muitas vezes isso impede uma escuta qualificada, mas é possível estimular narrativas, pois assim traremos dados importantes para o cuidado", considerou Ricardo, comentando dados de uma pesquisa feita nos Estados Unidos, que revela que um paciente não consegue falar mais que 16 segundos sem ser interrompido pelo médico. "Isso é um problema grave, um quadro que precisamos reverter", disse ele. Como pontos a serem perseguidos, o médico apontou mais continência e continuidade nos serviços, mais participação dos usuários, mais compromisso dos profissionais, mais resolutividade e mais envolvimento do usuário e das famílias nas ações de cuidado. "O atendimento minimalista mina o cuidado. É preciso responsabilidade e compromisso por parte dos profissionais. Além disso, é válido ressaltar que o trabalho em saúde são encontros entre sujeitos. Portanto, o outro é fundamental para mim". Finalizando sua palestra, Ricardo apontou também a importância de uma abordagem intersetorial ativa. "É preciso tentar implementar isso em todos os espaços que temos. Não devemos esperar as esferas de governo se articularem se eu mesmo posso fazer essa intersetorialidade em nível local, indicando escolas, atividades e outras iniciativas aos meus pacientes. É claro que é importante que esas iniciativas se tornem políticas institucionais, mas eu posso fazê-las antes disso, completou ele.
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