Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e automedicação.

Fazem parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, quanto do desenvolvimento social e econômico global da comunidade. (Declaração de Alma-Ata)

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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O Programa de Saúde da Família do Brasil

Publicado, originalmente, no British Medical Journal.
BMJ 2010; 341:c4945 doi: 10.1136/bmj.c4945 (Publicado em 29 de Novembro 2010) ; Citar como: BMJ 2010; 341:c4945

EDITORIAL

O Programa de Saúde da Família do Brasil

Matthew Harris, ‘Academic Clinical Fellow’ (ACF) em saúde pública1,
Andy Haines, Professor de saúde pública e atenção primária2


Um sucesso custo-efetivo do qual países de alta renda poderiam tirar lições


As reformas do setor saúde no Brasil iniciaram-se em 1988, como parte de um movimento sócio-político mais abrangente e ao final de aproximadamente 20 anos de ditadura militar. A nova Constituição foi embasada nos princípios de descentralização política e orçamentária, na participação da comunidade para a definição das prioridades orçamentárias locais e no reconhecimento da saúde e do acesso a ela como direito humano universal.
Estes pressupostos constituíram a base para o Sistema Único de Saúde (SUS) e deram início a uma mudança nacional, de uma atenção à saúde baseada em centros terciários para a atenção primária integral à saúde, gratuita, financiada em bases tributárias e inspirada pela Declaração de Alma-Ata (1978).

Ao longo dos últimos 15 anos, o avanço na saúde pública do Brasil tem sido notável. A mortalidade infantil caiu de 48/1.000 para 17/1.000. Somente nos últimos 5 anos, internações hospitalares devidas a diabetes e AVC diminuíram em 25%; a proporção de crianças abaixo de 5 anos com baixo peso caiu em 67%; mais de 75% das gestantes agora recebe sete ou mais consultas de pré-natal e a cobertura vacinal de tríplice bacteriana (difteria, tétano e coqueluche) em crianças menores de um ano é superior a 95% na maioria dos municípios (1). Mesmo os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) das Nações Unidas almejaram alcançar menos que isso (2).
Embora estas medidas reflitam avanços em todo o sistema de saúde, há evidência para indicar que o alicerce destes resultados positivos do SUS seja o Programa de Saúde da Família (PSF), implementado alguns anos após as reformas constitucionais (3,4). Este programa se expandiu nacionalmente e atualmente provê serviços integrais de atenção primária a 95% dos municípios brasileiros, cobrindo mais de 55% da população do país – mais de 85 milhões de pessoas.
O Programa de Saúde da Família baseia-se em um modelo simples – equipes multidisciplinares compostas por um médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem e de quatro a seis agentes comunitários de saúde; esta equipe trabalha baseada em unidades de saúde distribuídas em áreas geográficas determinadas, cada qual cobrindo não mais que 5.000 residentes.
O agente comunitário de saúde é responsável por acompanhar até 120 famílias em sua área e deve realizar pelo menos uma visita mensal a cada um destes domicílios. Estes agentes estão completamente integrados à equipe de atenção primária e atuam de maneira multifuncional. Apesar das ações de atenção à saúde materna e infantil serem o cerne de seu trabalho, também agem apoiando cuidados terapêuticos, avaliando e referenciando pessoas às unidades de saúde, fomentando cuidados de promoção à saúde para doentes crônicos e incentivando a participação social e comunitária. É requisito obrigatório para os agentes comunitários de saúde residirem na área na qual trabalham.
As responsabilidades de suporte logístico e financeiro a estas unidades de saúde (APS) foram designadas aos municípios, o que confere flexibilidade e autonomia no provimento deste modelo de atenção primária. Entretanto, o financiamento da saúde está vinculado ao nível federal, com aportes dos cofres nacional e regional. A escala desta reforma de saúde não encontra precedentes, e continua expandindo-se para alcançar a cobertura universal. Em apenas 15 anos, o Brasil recrutou um exército de 250.000 agentes comunitários de saúde e 30.000 médicos generalistas.
Apesar destes avanços notáveis, o Programa de Saúde da Família tem enfrentado desafios que podem fornecer lições proveitosas a outros países. Eles incluem dificuldades no recrutamento e retenção de médicos com formação adequada ao provimento de serviços de APS, ampla variação na qualidade local da atenção, integração fragmentada dos serviços de APS aos dos níveis secundário e terciário (5) e maior dificuldade de expansão do PSF em grandes centros urbanos (6), onde a classe média acostumou-se aos serviços de saúde privados. Além do mais, embora o Programa de Saúde da Família custe apenas US$ 31-50 (£20-32; €24-39) per capita/ano (7), a manutenção de adequado suporte financeiro a sua expansão nacional tem algumas vezes sido problemática (8).
O Programa de Saúde da Família do Brasil é provavelmente o exemplo mundial mais impressionante de um sistema de atenção primária integral de rápida expansão e bom custo-efetividade. Mas seus êxitos não têm recebido o merecido reconhecimento internacional. O potencial das reformas em saúde no Brasil e, especificamente, do Programa de Saúde da Família, em prover atenção em saúde a um custo acessível foi mencionado há 15 ou mais anos atrás no British Medical Journal (BMJ) (9, 10). Em muitos aspectos aquela promessa foi mais do que cumprida, mas a história de sucesso da atenção primária em saúde do Brasil continua pouco compreendida e ainda fracamente difundida ou interpretada para outros contextos.
Países de renda elevada poderiam aprender como este programa alterou a interação com as doenças crônicas, com a demanda por serviços de cuidados terciários e com a promoção da saúde.
Através do Programa de Saúde da Família, agentes comunitários de saúde identificam de forma pró-ativa problemas no manejo de doenças crônicas e adesão ao uso de medicamentos; apoiam a escolha de hábitos de vida saudáveis através da promoção da saúde e educação a nível domiciliar; promovem a contínua atualização dos registros familiares e garantem uma vigilância à saúde com base na população geral – e não apenas naqueles que procuram os serviços formais de saúde; finalmente, eles podem identificar quadros agudos simples em saúde, com possibilidade de abordagem domiciliar. Estes são desafios ainda enfrentados pelo Sistema Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS). As lições do Brasil podem ser particularmente relevantes no atual cenário econômico mundial.
Em muitos aspectos o Brasil acertou: um programa de atenção primária custo-efetivo e de larga escala que aborda questões de saúde pública típicas de países de baixa renda e daqueles em transição epidemiológica, mas também relevante para os países de alta renda. A ascensão política e econômica do Brasil no mundo (11) deve englobar seu papel de liderança na atenção primária em saúde (APS). Todos temos muito a aprender – façam o sistema funcionar corretamente e os resultados virão, mesmo com recursos limitados.
Os formuladores de políticas em saúde no Reino Unido têm um histórico em observar os Estados Unidos da América na busca de exemplos de inovação no provimento de atenção à saúde, apesar de seus resultados relativamente fracos e altos custos. Eles poderiam aprender muito voltando seus olhares ao Brasil.
(Nenhum conflito de interesses foi declarado ou observado por parte dos autores)

Referências

(1) Ministry of Health, Brazil. Orientações acerca dos indicadores de monitoramento. Avaliação do pacto pela saúde, nos componentes pela vida e de gestão para o Biênio 2010-2011. 2010. Conforme portaria no 2669 gm/ms de 03 de novembro de 2009.http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt2669_03_11_2009.html.
(2) United Nations. Millennium Development Goals Report, 2010. http://europeandcis.undp.org/poverty/show/82C7F6F2-F203-1EE9-BE080A09010FCB92.
(3) Macinko J, Marinho de Souza Mde F, Guanais FC, da Silva Simões CC. Going to scale with communitybased primary care: an analysis of the family health program and infant mortality in Brazil, 1999-2004. Soc Sci Med2007;65:2070-80.
(4) Guanais FC, Macinko J. The health effects of decentralizing primary care in Brazil. Health Aff2009;28:1127 -35.
(5) Harris M, Ferreira A, Morães I, de Andrade F, de Souza D. Reply letter utilization by secondary level specialists in a municipality in Brazil: a qualitative study. Rev Panam Salud Publica2007:21:96-110.
(6) Campos GW. Suficiencias e insuficiencias da política para a Atençao Básica no Brasil: debate. Cad Saúde Pública2008;24:s17-19.
(7) Global Development Network. Evaluating the impact of community based health interventions: evidence from Brazil’s family health program. 2009. Working Paper 1.
(8) Brazil’s march towards universal coverage. Bull World Health Organ2010;88:646-.
 www.who.int/bulletin/volumes/88/9/10-020910.pdf.
(9) Haines A. Healthcare in Brazil. BMJ1993;306:503-6.
(10) Haines A, Wartchow E, Stein A, Dourado EM, Pollock J, Stilwell B. Primary care at last for Brazil? BMJ1995;310;1346-7.
(11) Guardiola-Rivera O. What if Latin America ruled the world? How the south will take the north into the 22nd century. Bloomsbury Press, 2010.

Tradução ao Português: Newton Lemos—Consultor técnico OPAS/OMS Brasil em Serviços de Saúde.

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